Lembro a noite e lembro a manhã.
Recordo a estrada coberta de cinza que se abria vertiginosamente à minha frente enquanto, sem que eu soubesse, os mares se afastavam para que pudesses caminhar.
Acelera mais um pouco, peço-te.
Põe a música mais alta e cala tudo o que não quero ouvir... Cala a minha voz e o meu coração que agora me bloqueiam o raciocínio e me aborrecem o olhar.
Cala-te tu também e vai até onde o mundo acaba.
"Onde queres ir? Gostava de ver o mar..."
Não quero ver o mar! Leva-me para longe, para onde queiras ir... Mas não para perto do mar.
Leva-me ao fim do mundo, pede-te a voz dentro da minha cabeça.
Fecho os olhos e encolho-me ao teu lado. Sei que estás a olhar para mim, julgas que durmo, que esqueci que atrás de nós se desenrola a serpente, que não lhe ouço o sibilar doloroso cada vez que o sol teima furar o nevoeiro.
Não quero saber! Só quero o silêncio, a música e que obedeças quando te digo que quero que me leves até ao fim do mundo. Não quero saber do veneno que escorre em jeito de poema pelas presas da serpente e finjo ignorar que foram as tuas mãos que me acordaram da serenidade da noite, porque na verdade ignoro.
Não páres nesta estrada em que nada existe, pois todos os caminhos que percorrerei terão início aqui e não quero.
Penso.
Peço-te.
"Posso ler-vos um poema ?" sibila a serpente. Olho para trás e de novo volto-me para ti, sem te ver, e por esta vez o ar enche-se de palavras, de aventuras parisienses, risos e medo. Medo dos sonhos em que os altares se incendeiam, medo da voz que me grita: A noite é eterna! enquanto desenlaço a corda à volta dos pulsos, medo por simplesmente sentir medo das horas que virão.
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