venerdì 7 dicembre 2007

(n)As palavras dos outros

Pessoas que não se olham
Sentadas ao lado umas das outras
Até que algo acontece.

Levo-te pela mão
Até viveres outra vez.
Amparo o peso do teu corpo
Até sorrires outra vez.
A minha mão no teu ombro
O meu olhar na minha mão no teu ombro.

Até que algo acontece.
Até que algo aconteça outra vez.

Vou parar por aqui,
Continuo dentro da minha cabeça.

Fernando Ribeiro, "Até que algo acontece" (in Diálogo de Vultos)




venerdì 23 novembre 2007

Metamorphósis

Ódio: aversão; raiva; rancor profundo; antipatia; repulsão; horror.




P.S. Idem

A ouvir Something I Can Never Have - Nine Inch Nails

giovedì 25 ottobre 2007

"I can resist anything but temptation"

«(...)Eu sou as sete pragas sobre o Nilo e a alma dos Bórgias a penar!...»
José de Almada Negreiros, in a Cena do Ódio



Comovo-me perante a paixão que não pedi. Assusto-me com as rosas que secam de obsessão e enceto, (in)conscientemente, uma caça em que o caçador deita o pescoço numa armadilha sobejamente conhecida. Vacilo entre o querer ser mártir e o querer martirizar e agora sei qual é o momento do qual nenhum ser humano pode escapar, aquele em que se vê frente a frente com o seu verdadeiro eu. Acredito que alguns não aguentem e fujam aos gritos, eu fico! Mais do que tudo sempre quis saber quem sou.
Sei-me entre o bem e o mal, sem conseguir optar. Não consigo erguer um único dedo que mostre o leve indício de que me quero pronunciar, tenho a perfeita consciência que não quero ouvir a minha voz.
Não quero estar frente à tentação, conheço-me. Sei que não resistirei pelo simples prazer de lhe sentir o sabor e essa sensação estará comigo por toda a eternidade.
E a eternidade é mais tempo do que o que eu conseguirei suportar.








domenica 14 ottobre 2007

Escuta. Escuto.
O silêncio envolto nos segundos que antecedem o nascer do dia, quando o céu se corta na troca que fizeste aos ponteiros do relógio.
Escuta. Escuto.
Os murmúrios derretem-se na boca, mergulham em queda livre dentro de ti para te furarem as entranhas, insaciáveis do teu tremer.
Ouve-me. Não consigo.
Leio-te.

lunedì 24 settembre 2007

«Sobre uma bala dirijo-me ao meu deus, alguém criado pela minha própria ilusão. Gostaria de lhe dizer que estou no inferno e que grito todos os dias, talvez porque viva apenas com a esperança de alguém me olhar.
Não durmo, não consigo tirar tempo ao que me resta para conhecer os meus pensamentos, certezas não tenho. Apenas sei que a morte vai surgir de repente e, a sorrir, oferecer-me a paz.
Desejaria rezar para sobreviver, mas sei que não basta fechar os olhos para fugir à própria tragédia. Afinal estou morto de mais para poder morrer, acreditei ter força suficiente para não me asfixiar, apenas pude suspirar quando quis soltar um grito. Morri no instante em que pensei ter começado a viver, porque não era possível continuar vazio por dentro. Desconhecia (talvez) ter nascido para não viver, cortei-me e a felicidade foi a primeira coisa a sair de dentro de mim. (...)
O tempo passa depressa, o dia esvai-se dentro de mim, os primeiros traços de escuridão de há uns meses ocupam cada vez mais espaço. Na mais profunda solidão espero ser livre, desesperado e abandonado choro, não tenho forças para lutar por muito mais tempo.(...)»

Excerto das cartas de Miguel (in As lições do Abismo de Daniel Sampaio)


Caminhar por estradas escusas, sem temer as trevas. A maior escuridão encontra-se dentro de nós. Open your eyes and see.

Never forget!

P.S. «Il faut prendre les leçons d'abîme», Júlio Verne

sabato 8 settembre 2007

Away, never far enough

Esta cidade sufoca-me. É uma caixa de vidro cujas paredes avançam lentamente sobre mim e o vidro fala-me, toca-me, enlaça-se em torno do meu corpo e rouba-me os movimentos, tolhe-me a funcionalidade do pensar, acelera-me a respiração num aviso de que será a última vez. As pessoas desta cidade estrangulam-me. Abatem-me as crenças, laminam-me os sorrisos e extraiem-me as lágrimas que bebem por largas e aúreas taças com que vão brindando numa orgia de sussurros.
Esta cidade define-me e definha-me, abraça-me e pune-me, lê-me como se eu fosse personagem de um livro que passa de mão em mão. Aqui a distância não o é, encurta-se a cada música que ouço, a cada palavra que apago no papel para em seguida a escrever sob a minha pele, a cada página em branco que viro com as mãos manietadas pela memória.



lunedì 27 agosto 2007

Inocência

Posso afirmar com toda a certeza que já nada me prende aqui. É nestas alturas, aquando da percepção de um mundo que convida a tudo menos a uma existência saboreada sem laivos a fel, que ganho a imensa vontade de me misturar com a tinta que cobre as paredes da casa que um dia sonhei. Lembro-me dos lápis alinhados desordeiramente ao lado da folha de papel A4 ligeiramente amarrotada. Confesso que nunca tive muito jeito para desenhar, aborrecia-me porque à partida seria uma jogada perdida, nada se parecia com o que era suposto parecer, as mãos ficavam demasiado sujas e o papel acabava, inevitavelmente, no lixo. Mas lembro-me que, naquele dia, segurei o melhor que pude a folha com a minha mão esquerda enquanto que na direita crescia a indecisão da escolha das côres para a minha casa. Agarrei o lápis com muita força e desenhei. Desenhei o melhor que pude a minha casa, para que fosse a mais bela, para que a folha não fosse morrer no caixote do lixo, para que este primeiro projecto vingasse, porque seria o meu ninho e a minha fortaleza. Concentrei toda a minha atenção nuns míseros centrímetros de papel amarrotado, acabei e sorri. Sorri de contentamento porque a minha casa era tal e qual como eu a havia sonhado, foi o desenho mais perfeito que alguma vez surgiu das minhas mãos e o meu desenho era a lua.

martedì 7 agosto 2007

H.R. Gigger


Não desejando a particularidade de ouvir para além do que se deseja, abraçar o espaço preenchido de imensos nadas e mergulhar bem dentro do que se é. A visão nem sempre anda de mãos dadas com a crença e o sentir é apenas isso... um desejo na ponta do indicador. O que vês para além de um corpo exposto?
Eu vejo a benção do silêncio.

lunedì 23 luglio 2007

Endless sleep

Odeio-te! Odeio-te até ao final dos tempos, até que a terra seja a imensidão do deserto. Porque foste a mais bela das ilusões e a mais negra realidade.
A ti, a_mor_te. Dentro de mim.



I know no shame.

The empire of my desire
Gathers you into my fire
I hope you fall. Hope you call,
My filthy name. It makes you crawl
on your knees, with all your pleas
Lay down there, look up at me.

Are you alive my dear, and breathing?
Are you diseased my dear, and bleeding?
I'll lift you high above my dear,
I'll have you dreaming.
`Tis time to say farewell, to your pleading.

Poor devil as thou art. A ruin at my feet.
Go drop your little life, and welcome up my sleep.
So briefly at my side. So simple in defeat.

No more lies utter from you.
From mine eyes I must take you.
No longer wise. Nothing is new.
Tears for my trembling faith.
You shall not die unsung.

Goodbye my dear, you wicked thing.
I have no tears, beautiful thing.
No silver pail to catch them in.
So ends this tale you did not win.

"The Scarlet Garden" - My Dying Bride

lunedì 16 luglio 2007

From childhood's hour I have not been
As others were; I have not seen
As others saw; I could not bring
My passions from a common spring.
From the same source I have not taken
My sorrow; I could not awaken
My heart to joy at the same tone;
And all I loved, I loved alone.
Then- in my childhood, in the dawn
Of a most stormy life- was drawn
From every depth of good and ill
The mystery which binds me still:
From the torrent, or the fountain,
From the red cliff of the mountain,
From the sun that round me rolled
In its autumn tint of gold,
From the lightning in the sky
As it passed me flying by,
From the thunder and the storm,
And the cloud that took the form
(When the rest of Heaven was blue)
Of a demon in my view.

Edgar Allan Poe, Alone


Ainda que as águas subam na recuperação do que um dia lhes pertenceu, ainda que a carne definhe na busca constante da existência prometida, ainda que as trevas engulam o céu e o fogo mergulhe no mundo em compridas línguas, os braços erguer-se-ão ao bater da terceira badalada da terceira hora da noite.
Virá o medo.
E o que um dia existiu perder-se-à ante a gargalhada profunda dos que resgatam quem perdeu a fé.

venerdì 6 luglio 2007


5h e 3 minutos.

Cinco horas e três minutos.

Segundo após segundo.

Cinco horas e quatro minutos.

Os cigarros amontoam-se sobre os centésimos de segundos. É a dormência, a passividade sem côr, uma cratera imensa onde nada se encontra. Um espaço limpo, desprovido de nada.
As paredes não sufocam. Não há paredes.
Não há oxigénio, sobrevive-se com menos do que isso. Há um eu transparente, a teimosia em consumir fragmentos de milhares de personagens ridículamente adoráveis, pequenas marionetas dóceis como cães. Sempre esperei vislumbrar-lhes aquele esgar de dor agonizante, o presságio de que rasgariam a pele parindo a perfeição, mas as marionetas são tão vazias, não se movimentam sem mim. Deitam-se quietas e chamam-me baixinho. Ouço-as sussurrar baixo, cada vez mais baixo, que a perfeição nasce da morte.


Contemplato per Jorge dos Santos Gouveia

Quando tudo o resto falha, imobilizo a mente e deixo o corpo ir onde quiser enquanto espero que não volte... Já não tenho mais linha com que suturar as feridas e as marionetas precisam de dormir.

giovedì 21 giugno 2007

Once upon a time...

"The cold wind blew into my life, my adored. "
She Dies - Draconian

Sentir-te… ainda… escondido dentro de mim, como se assim não te pudesse encontrar. Quererei eu encontrar-te? Ter a certeza cruel de que irei sofrer um pouco mais?! Como se já não me doesse o suficiente este tempo em que me movo, estas noites de um sono atormentado que teima em não vir, as dúvidas que se acumulam sobre a certeza de que esta vida não é para mim.
Lembro-me de, uma manhã, ter acordado após desejar a morte, de me ter arrastado à procura da purificação da água e mesmo assim os meus olhos não se aquietaram. Quis engolir a tua dor, beber as tuas lágrimas, escudar-te da mágoa… nunca tive a noção de que as tuas mãos se tinham tornado punhais, que as tuas palavras me roubavam cada inspirar e que transformaste a noite num inferno.
Depois de ti veio o medo, a angústia, o desespero em existir aqui e a vontade imensa de querer fugir para onde não me conhecessem, para um sítio onde cada passo não me recordasse de ti. Are you still here? Am I real? Do I want you to be here?

Tell me, when have you brought darkness into my dreams?
Never... isto é apenas a realidade em que me deixaste acordada.




mercoledì 6 giugno 2007

Encantação


Contemplato per La Tempesta


Apetece-me o ódio a rasgar a pele, a entranhar-se na língua, a provocar o vómito acompanhado das lágrimas. Apetece-me as mãos encrespadas de garras afiadas rasgando a carne em dilacerante amor, a tesoura a passear pelos cabelos em cortes decididos junto à pele marmórea e doente. Apetece-me os olhos entreabertos em flamejante raiva e a vontade da morte a subir-me à garganta irrompendo num grito, meu, neste monte que habito onde todas as manhãs os vendavais me batem à porta. Desejo que o corpo se separe da alma e corra pela noite dentro em perseguição do sorriso que consigo cheirar, anseio que o sangue usurpe a paz momentânea que a minha mente adivinha e os olhos ausentes não me mostram e eu desejo... e eu anseio... que pelo negrume que tapou a lua os meus pensamentos ecoem como almas que dançam à volta das campas sem que ninguém as veja, que a minha lembrança assombre os sonhos, que o meu veneno invada as narinas e intoxique cada respirar. Que seja a minha imagem dilacerada e esquecida as notas que se transformam em música, que estas cordas que me orquestram os pulsos se soltem jamais, que os demónios fiquem aninhados no âmago e plantem o infortúnio, a desgraça, o amor traído, a dor inconsumível. Apetece-me que tudo o que foi construído rua num simples sopro, desabe a cada promessa de felicidade, que tudo se esvaia por entre os dedos... ao alcançe da mão.
Que no último respirar seja a minha mão que leve a escuridão.

A ouvir Too Cold For Tears - Swallow The Sun

Sahara

Escrevo-te no meio do que um dia teve vida, do que encheu o silêncio em movimentos suaves nos quais o vento se entretia em pequenos saltos de tempo. Escrevo-te em pequenos milésimos de segundos entediados pelo respirar compassado, envenenado e possante. O silêncio que transporta todas as palavras e que insiste em voltar atrás, devolvendo-me frases insignificantes, pálpebras insones perdidas no branco luminoso do sol que fere a retina e leva a uma cegueira louca.
Sinto a insanidade a roçar-me o son(h)o, o desalento a asfixiar-me o pensamento e a inércia tolher-me os movimentos. Das mãos nascem cristais baços, num parir repetitivo. Sem dor, sem comoção, sem um único traço de uma possível crença, um bater mecânico cuja única função é ecoar. Consegues ouvir?
Diz-me, consegues ouvir? PORQUE É QUE NÃO QUERES OUVIR??????????
OUVE AGORA! Não é possível semear a crença em mentes inférteis, porque o deserto abriu caminho pelo ventre da esperança e acamou-se para todo o sempre.
Poderás escavar apenas com as tuas mãos, uma após a outra mergulhadas num corpo árido que se oferece ao fogo que não consome. Não encontrarás lágrimas para beber, não mais encontrarás dor para te alimentares.
Daqui, já nada tens para levar mas podes arrancar um pedaço para guardares em ti.
Sabes... aqui é como o deserto, podes roubar-lhe um pouco de areia mas em nada o alterarás.

lunedì 28 maggio 2007

inVisibilidade

«(...) olhando fixamente o espaço cheio de trevas, agachado lá no fundo da minha amada caverna, num desespero que me embriaga como vinho, firo com as minhas possantes mãos o meu peito em pedaços. (...)»

Lautréamont, excerto do Canto Primeiro (in Cantos de Maldoror)


sabato 12 maggio 2007

Falo em silêncio

Aqui, nesta dualidade latente em que a loucura dá passos maiores que o intervalo da respiração, consigo (de alguma forma) ter a noção que, se me deixar levar pela presença etérea das lembranças deixarei de fazer todo e qualquer sentido. Que a hipótese de devotar este rastejar à existência de milhares materializados numa só face pode ser o desembocar da privação a que me tenho imposto.
Evito a fala, a música que me foi usurpada, a roupa que me escolheram... consigo, conscientemente, esquivar-me a tudo e qualquer coisa que me possa recordar os dias em que sorri. Faço-o com a plena noção de que este é o caminho a seguir, rasgo todo e qualquer laço com quem um dia acreditei poder ser, esbato as cores que ousaram roçar as minhas auroras e abraço com o sangue que me resta a mágoa que me predestinei.
Não serei profetiza. Não almejei um futuro longo e interminável aos meus sorrisos... tão somente acreditei.
É de dia já... e tudo se torna mais suportável. Posso fechar os olhos confiante que só eu acordarei lado a lado com o que não se vê e não me pertence.

lunedì 7 maggio 2007

Há que ter a noção que o tempo não pára sem ser para nós. Há que ter a noção que há vidas que têm um início do qual não temos memória, mas às quais conseguimos decifrar o fim e profetizar a maior das trevas.
Jamais em tempo algum tive a perfeita noção de não querer estar em algum lugar, sentir-me um animal encurralado, mas um dia a sensação chega e toma conta.
Deverei agradecer?
A ironia diz-me que sim, portanto... obrigado.


A ouvir Hermeticum - Daemonarch

venerdì 27 aprile 2007

Untitled (no need for more)

Há uma imensidão na escrita que não consigo transpôr para além de mim. Há esta dor que não sei bem de onde surge e porque grita assim. Há toda uma incongruência no sentir dentro de mim e fora do que eu acreditei ser. Há algum ponto nesta conjunção de acontecimentos, no modo como o universo foi criado, na orquestração de órbitas pessoais, no ritmado dia a dia espelhado de tédio, no simples deitar esperançoso de que não irá haver um outro erguer... há algo em tudo isto que conduz a uma insatisfação que não consigo colmatar.
Quis tanto gritar... Se soubesses o quanto eu quis gritar...
Até àquele momento em que tive a perfeita noção de que se tinha escrito o final, quis abrir a boca troantemente. Fi-lo mas não saiu um único som.
Não se pode falar sobre o que é inexistente, sobre o que ocupa espaço algures neste emaranhado de mim que se confunde em fiapos de algo, de algo, de algo como... como o nada.
Não se escreve sobre o vazio.
Não se lê sobre o vazio.
É-se o vazio mas não se fala sobre isso.





Ainda hoje tento lembrar o exacto momento em que me perdi...

giovedì 26 aprile 2007


Libera me , Officium Defunctorum
Contemplato per La Tempesta

martedì 17 aprile 2007

Inexistência

Que imenso prazer retiraria eu da morte, se esta fosse tua detentora. Ver-te definhar, o olhar horrorizado pedindo clemência aos anos que passam e consciencializam o teu ego do esquecimento daqueles que não se voltam à tua passagem.
Sorrir-te-ei, uma última vez, quando deslizar a minha mão sobre os teus olhos e saberás que não vives, porque nada nem ninguém te recorda.


mercoledì 11 aprile 2007

60 segundos de um pensamento cansado

Sabes, o mundo é uma rua vasta onde os dias são longos e as noites intermináveis. É possível que na rua estejamos apenas nós. Frente a frente. Tu de um lado, eu do outro. Face to face.
Tu não passas para cá. E eu não quero que passes, para cá.

giovedì 29 marzo 2007

O vazio acolhe-me



Esta dormência que se instalou lado a lado com os lugares vazios que percorro começa a esgotar toda e qualquer possibilidade de existir uma vontade, ainda que remota, de me erguer.
Hoje acordei em mim sem ter conseguido adormecer os dias passados . Virei-me sobre a palma direita, aquela que insistias em encostar à tua face quando choraste e essa lembrança mantem-me aqui, a pensar que tenho que fugir de mim, mas sem conseguir saír de ti.

Sinto-me tal qual prisioneiro que risca os dias nas paredes sujas do cárcere mas, ironicamente, sou eu que possuo as chaves que abrem todas as portas, inclusivé a tua. Mas cruzo os braços e deixo que o pó da inutilização se vá acamando sobre a falta de força, a vontade que extinguiste, a esperança que abandonei.

Acabo sempre por me render ao abandono de algo, nem que seja de mim, porque já há muito tempo que caminho num mundo que se move paralelamente a este em que todos os outros percorrem estradas a céu aberto. Eu dou passos num só trilho. Um trilho que descobri no dia em que morri e que escolhi para mim esta tristeza abismal sem a qual, começo a acreditar, não saber viver.

Os sorrisos não me ficam bem e o calor da côr foge de mim, o que me apraz já que pinto a minha vida a negro, nesta capa de simplicidade.

Há neste constante viver a morrer uma suave dependência.

lunedì 19 marzo 2007

O que resta...

Quand le ciel bas et lourd pèse comme un couvercle
Sur l'esprit gémissant en proie aux longs ennuis,
Et que de l'horizon embrassant tout le cercle
Il nous verse un jour noir plus triste que les nuits;
Quand la terre est changée en un cachot humide,
Où l'Espérance, comme une chauve-souris,
S'en va battant les murs de sn aile timide
Et se cognant la tête à des plafonds pourris;
Quand la pluie étalant ses imenses traînées
D'une vaste prison imite les barreaux,
Et qu'un peuple muet d'infâmes araignées
Vient tendre ses filets au fond de nos cerveaux,
Des cloches tout à coup sautent avec furie
Et lancent vers le ciel un affreux hurlement,
Ainsi que des esprits errants et sans patrie
Qui se mettent à geindre opiniâtrement.
- Et de longs corbillards, sans tambours ni musique,
Défilent lentement dans mon âme; l'Espoir,
Vaincu, pleure, et l'Angoisse atroce, despotique,
Sur mon crâne incliné plante son drapeau noir.



Charles Baudelaire, "Spleen" (in As Flores do Mal)

lunedì 12 marzo 2007

Há algo em ti que me consome...
Não sei se é esta estranha dependência do teu cheiro, se o hábito à tua falta. Vacilo entre desejos e sou tão somente isso, um inconstante destroço da tua passagem por mim, o aperto do coração ao brotar das tuas lágrimas, esta saudade que não existe em mais nenhuma língua e não se escreve na minha.
E se pudesse, arrancaria todas as minhas entranhas para tas ofertar. Uma por uma, cada gota a marcar o chão aquando da entrega. Ajoelhar-me-ia perante ti erguendo bem alto o meu coração numa bandeja prateada, afinal é o único orgão que possui sentimentos.
O meu eu ensanguentado é a maior prenda que te posso dar.
É a única verdadeira.
De mim para ti...

mercoledì 7 marzo 2007

Penitência

Pode ver-se, atrás de cada janela, o semblante de uma só criança. Muito quieta, sentada numa cadeira de madeira já bamboleante da longevidade. As costas demasiado rectas, as palmas, frias, repousantes em cada perna hirta, o olhar estático para além do vidro. Dir-se-ia que está absorta de todo e qualquer ruído, de todo o ar que rodopia em seu redor e até a respiração é ténue, cada inspirar marca o compasso do silêncio.
Já está ali há dois dias e duas noites, este é o terceiro e não será o último. Sentou-se em frente há janela desde que o rio a chamou e ficou a alimentar-se das palavras que chegam a cada minuto enquanto as águas continuam a subir.
E serenamente sobem, como que na tentativa de resgatar o que um dia lhes pertenceu.
(Janeiro, 1977)



Já há muito que caminho paralelamente ao rio, sem nele banhar os pés desfigurados. Sabes, não sei como, mas habituei-me a fazer das chamas trilho, como se a dor fosse a única coisa real, já que aquando do momento em que me chamaste do rio, um silêncio enorme tomou conta de mim. Sentei-me e fiquei tal qual estátua acreditando que me virias buscar. Não pestanejei uma única vez, com receio de que isso pudesse atrasar a tua chegada. Na falta das palavras prostrei-me ao uivar do vento que batia naquela janela, ao teu cheiro que conseguia passar pelas frestas da madeira, as tuas mãos à minha volta acariciando-me a face invisivelmente. Fui ficando, cobrindo-me de pó enquanto não chegavas. No meu olhar as águas continuavam a subir para me resgatar.
Uma noite as águas tingiram-se de vermelho, já não subiam. As águas desciam por mim, copiosamente. Olhei à minha volta, continuava em frente à janela em silêncio. O vento havia parado, o teu odor já não se esgueirava pelas frestas da mdeira envelhecida. Abri as narinas perigosamente, como um animal que procura o cheiro da presa que vinha seguindo, aspirei o ar em golfadas que desceram os meus pulmões vertiginosamente. O teu cheiro desapareceu, mas as águas continuavam a descer por mim ensanguentando-me a pele,inundando tudo ao meu redor. E agora sim, sobem, consigo sentir-lhes o sabor quente, espesso, de mim. Chorei um rio de sangue para que te banhasses nele, mas tu nunca quiseste mergulhar em mim.
Afundo-me só, com as mãos unidas acima da cabeça.

martedì 27 febbraio 2007

É a terra, que sulcas, a cama em que te deitas. Submerges ao olhar passivo, perdes-te na impunidade das frases e viras as costas à alma que se prostra perante a tua dor. Em noites que não findam as palavras desaparecem no código do silêncio.
E é fácil jogar com a vida, sabendo que a morte virá no momento exacto em que decidires respirar.

venerdì 16 febbraio 2007

Doomed

A marca permanecerá até ao final da vida como a conheço. Por todos os tempos a dor não será esquecida, será bradada a cada esquina, em cada uivar do vento, em todas as paredes imprimirei as minhas mãos vazias, carregarei o negro que me cobre até ao olhar e a mágoa será o meu estandarte. Porque no fim dos séculos e quando chegar a luz que engolirá o mundo, eu gritarei mil vezes o teu nome e tu caminharás por vento e por fogo, em todos os milénios a que a tua alma voltar e... quando, o meu nome gatinhar ferozmente pela tua garganta para poder respirar e inflamar-se de vida, será um grito de agonia e tu, eternamente, serás pranto e esquecimento.
Por todos os tempos. Em todos os tempos. Até ao final dos tempos.


sabato 10 febbraio 2007

In silentium

As paredes grotescas desse castelo, em que definhas, gritam de dor.
Eu estou do lado de fora, acariciando a pedra rugosa, fria e intransponível. Ouço o deslizar das tuas lágrimas ao compasso com que dedilhas as cordas de aço que não consigo desentrelaçar.
Continuo do outro lado da porta, a fronte encostada à madeira como se assim me conseguisses sentir porque, daqui, eu vejo a luz disforme que te acompanha.
À noite, frente a frente com a ilusão , ouço-te cada inspirar e fecho os olhos à espera que a tua imagem se preencha de negro, cada contorno retocado, cada lágrima contida no silêncio.
Quando as ameias ruírem pela erosão da futilidade e as bonecas de porcelana perderem a côr, desce as escadas, empurra a pesada porta com a força que te restar, ergue aos céus o teu olhar e vem acordar-me sob o manto negro em que, sonolentamente, te tenho aguardado.




lunedì 5 febbraio 2007

Os braços escudam o corpo-fetal-despido, as pálpebras em fogo descem, os joelhos, nús, magoados do "caminhar", aproximam-se da boca e os lábios secos, da privação, entreabrem-se. O instinto primordial manda lamber as feridas.
A água desce sobre os ombros, enquanto o corpo se enrosca mais e mais como se daí surgisse o vislumbrar de um novo amanhecer. Aqui, entre estas quatros paredes, é o santuário a que os anjos de asas negras não chegam, aqui as preces que se verbalizam não pretendem ser escutadas, brotam dos cortes da descrença e a voz é o silêncio, aqui pode chorar-se sem se ser observado, sem ter que explicar aquilo que não se coloca por palavras, sem ter que mostrar esta dor que consome, que impera, que lateja aos ouvidos numa surdez momentânea.
E a água desce sobre os ombros e o corpo enrosca-se mais e mais, e já não se acredita num novo amanhecer, mas aqui, nesta redoma de vapor quente o corpo aquieta-se e não espera.
Aqui, questiona-se o nascimento, a existência, a divindade, o abandono. Acarinha-se e amaldiçoa-se a mesma lua de uma só noite e isto não se explica, aqui reside um só corpo na presença dos milhares que se foram, a exposição a todos os males, o observar extasiado do veneno que se sabe percorrer as veias, aqui grita-se sem se ser ouvido.
E a água desce sobre os ombros, ininterruptamente, lavando o corpo, somente o corpo... Aqui ouve-se a mesma música vezes sem conta, chamam-se as lágrimas, arranham-se os braços e traçam-se objectivos que nunca vão ser atingidos, mas não há medo, porque aqui, os anjos de asas negras não entram, não se sentam a contemplar a miséria que cobre a pele. Porque, neste silêncio inundado de luz, neste ritual de pureza momentânea, prepara-se uma nova caminhada... ainda que para o fim.

venerdì 2 febbraio 2007

Chama-me...

Ouve-me no vento, nas chamas, nos mares que se erguem para amortalhar, na chuva de pedra, nas águas que invadem a terra e reclamam o que um dia foi seu.
Estou em tudo o que tocas ainda que não queiras.
Sou eu que te percorro as veias, que te queimo o peito, que te atormento as noites numa febre insone, que deslizo sobre a tua pele e te sugo toda e qualquer gota de esperança.
O ar que respiras sou eu que to exalo, cada vez que o teu peito se ergue são as minhas unhas que asfixiam o teu coração.
Se o deixares ficar nelas irá arder? Aguarda e escuta... e sente que, apaixonadamente, sempre te mantive enlaçado em mim, eu engoli toda a miséria que quis corroer-te a alma.
Eu mantenho-me dentro de ti e sentes-me intoxicar-te...
Ouve-me clamar o teu nome nas cordas que percorres suavemente sem saber que é na minha boca que mergulhas os dedos, vê-me naquele momento em que o sol te cega, nos teus pesadelos sou o sonho que tentas alcançar, caminha para mim ainda que saibas que o única abraço que te oferto seja marmóreo.
Vem até mim sem esperança, com os olhos cegos de mágoa, porque na noite é a mim que a tua dor chama porque nenhum outro ser a ouve... esquece o que resta, porque eu comando os mundos que conheces, eu aniquilo os que se cruzam no teu caminho pois a tua imagem é a sublimação e contrasta ironicamente com os teus semelhantes.
Eu sou as palavras da noite que lês quando as lágrimas te permitem.
Eu sussurrei o teu nome à exaustão e com ele erigi impérios, exaltei as águas, cobri a terra de trevas para que pudesses caminhar sem igual. O teu nome está inscrito em todos os tempos, foi a última palavra que Cristo ouviu antes da carne se rasgar uma derradeira vez, o teu nome é entoado por cada mãe que embala o filho, por cada homem que perece abandonado sem força para continuar, por cada faca que perfura, a cada lágrima que surge na última gota de pureza que se esvai. O teu nome sou eu que o escrevo a sangue nos céus, sou eu que o profiro em cada voz que te chama, porque te profetizei um reino intransponível e único.
E a tua dor escolheu-me para alcova porque os meus braços são as asas de mil corvos que invadem os céus e usurpam a noite para te embalar na mais negra das melodias.
Ouve-me, chamo-te como sempre ansiaste.
Porque sempre soubeste... que há um preço a pagar pela beleza.

mercoledì 31 gennaio 2007

È arrivato


Before I go down
Cleave to me
Kiss and drown

Weave your web of lies
Catch the drifters by

Bring me love songs
Sing me black tunes
Read me kind words
Of sun and moon
Love me freely
Open up to me
Feel me closely
Say you love me

The wind brings them in
To your den of sin

Caught by your divine spell
Locked within your wishing well

Ice as eyes lured my soul
Look of lust froze me cold

Many lies holds your body
A true feast for all to see

Men will fall to her song
Women too, won't last long

My Dying Bride - Le Figlie Della Tempesta



E é o medo… do dia a seguir, das palavrasespada, do pesadelo escondido no sonho, dos objectivos nas pontas dos dedos, da vida tempestuosa, do vento seco, da esperança insistenteextinta, do acordar, das mãos vazias, do querer ser sempre mais, da noiteseguidadodiaqueantecedeaoutranoite, da chama que se bate contra o gelo, dos excessos, das falhas nos extremos, do sono ininterrupto, dos votos, do que lembramos (ainda), de não deixar doer.
E é o medo que galopa no dorso do cavalo de sangue.